Um dia vamos descobrir que fomos vitimados por um acidente antropológico
decorrente da nossa própria evolução. Este nos fez acreditar que racionalizar o
aspecto físico das pessoas é muito inteligente. Mas quem disse que beleza
existe?
Quem ama o feio, bonito lhe
parece!
Você já deve ter ouvido essa
expressão alguma dezena de vezes na sua vida.
Afinal, quase todo mundo já a
ouviu. Se não, é de se notar que você possa ter uma entre essas duas certezas: ou
você é alguém muito bonito e, naturalmente, escolheu muito bem os seus pares;
ou talvez, seja apenas horrível e os belos não te são atraentes.
E cá entre nós, não pense também
que todo mundo só gosta de gente bonita ao seu redor. Há quem prefira gente
daquele tipo que não têm características físicas destacadas. Estes também são
normais, quase asseguro.
Inevitavelmente, caso você seja
alguém dotado das tais características destacadas e já tenha gostado de outrem
popularmente desprovido de beleza, ouviu, e receio que muitas vezes, de
familiares, quiçá até de amigos, aquela frase batida e extremamente deselegante:
“Você acha mesmo que essa pessoa serve para
você?”. De outro modo, em alguma outra ótica menos favorável, você talvez seja
alguém popularmente horrível e tenha se aventurado em se relacionar com outra
pessoa reconhecidamente bela. Nesse segundo caso, a máxima, de forma análoga,
também se aplicou em algum momento a você.
Aliás, que me desculpem os feios,
mas beleza é fundamental! E que me desculpe também Vinícius de Moraes por
estragar sua frase feita, a encaixando onde não cabe.
Em tempo, a despeito das prolixas
e entediantes considerações iniciais - sobre as quais peço desculpas - a única verdade
sobre essas abordagens populares do aspecto físico das pessoas é tão óbvia
quanto certa e repousa na ideia de que somos todos muito diversos, primatas tão
absurdamente mais evoluídos que os outros animais, até mesmo do que os Ramapitthecus,
primeiros primatas catalogados na Terra. Somos o que há de mais nobre biomorfologicamente
na natureza: hominídeos com rostos e corpos extremamente diferentes, já agora antropoides,
ou seja, sem aquela cauda nada atraente dos primatas iniciais, temos alturas
muito variadas, cores e formatos complexos, mas que também somos seres que, de
forma bastante ingrata com a racionalidade e o aumento gradativo do cérebro nos
hominídeos, optamos por estar aliados a um determinado sistema de beleza, e
este, inadvertidamente, para piorar, varia demasiado de um lugar para o outro
do mundo, assumindo inúmeras variáveis indecifráveis e novos padrões, de acordo
com a nossa adaptação ao ambiente.
Enfim, esses somos nós: os que
decidimos que algo deve nos agradar visualmente. Assim, o homem brasileiro
gosta de mulheres mais curvilíneas, o americano já prefere magras com seios
fartos, nórdicos se encantam pelas longilíneas, e por aí vai.
Mas quem tem culpa nisso tudo?
A resposta é curiosamente muito
mais simples do que pode parecer: mutação genética. Sim, aquelas mesmas que
deram origem aos XMEN, mas que infelizmente, em nós, ao contrário do que se viu
nos filmes da série, só foram capazes de mudar aspectos físicos. As vulgarmente
conhecidas falhas no código genético de um indivíduo ou grupo que dão origem a
novas características específicas e que podem ou não ser adquiridas para as
gerações seguintes quando benéficas à espécie, em função de uma coisa chamada de
seleção natural. A extraordinária seleção natural, tão bem descrita por Charles
Darwin em seu tratado científico que visava a explicar a adaptação e a especialização
dos seres vivos ao seu ambiente, mediante a sua constante evolução.
Imagine você que somos tão
intuitivamente inteligentes a ponto de que em uma região onde os fisicamente
grandes sejam beneficiados, as mulheres do grupo prefiram se reproduzir com esses
homens maiores, de modo a propagar os genes daquelas alturas privilegiadas para
as gerações seguintes, o que aumentará gradativamente a população de pessoas
altas com o passar dos anos. Autoproteção natural e inevitável da espécie. Por
que você acha que os nórdicos são maiores que os sul-americanos? Logicamente,
os tempos atuais mudaram em certa medida a nossa concepção de mundo e, atualmente,
essas escolhas têm levado em consideração um sem-número de outros critérios, todavia,
em alguma época passada a seleção natural significou muito para a continuação
da espécie.
Por exemplo: por que no
hemisfério sul há pessoas com tons de pele mais escuro? Porque há que
considerar que em um dado momento a adaptação às intensas radiações solares no
ponto abaixo da linha do equador desencadeou uma produção acentuada de melanina
nesses grupos, essencial para a nossa sobrevivência em climas mais ensolarados,
o que nada mais foi do que uma grande adaptação biológica nos seres humanos dessas
populações. Por essa mesma razão, em maior ou em menor grau, pessoas que moram
no Brasil são mais claras do que as que moram no Congo, já que aquela região
africana é extremamente quente e seca e registra índices de radiação
ultravioleta altíssimos. Portanto, fica muito claro por essas observações que a
distribuição geográfica da cor da pele é diretamente relacionada à intensidade
da radiação solar, assim como outras adaptações morfológicas também o são.
Agora, imagine a complexidade a
que estamos submetidos, considerando que a cor da pele é apenas um exemplo
dentre milhares possíveis que explicam o fato de nós, seres humanos, sermos tão
diferentes entre nós mesmos. Poderíamos citar características que acreditamos
por mero desconhecimento terem sido bem mais importantes do ponto de vista estético
do que necessárias à adaptação genética. Enfim, cor dos olhos, densidade
capilar e de pelos através do corpo, estética do nariz, tamanho dos ouvidos,
formato e tamanho da cabeça, cor, forma e preenchimento labial, tipo de tronco
e sua proporção em relação ao corpo, são todas características que estão superficialmente
ligadas a padrões estéticos, mas que foram, naturalmente, imprescindíveis à
continuação da nossa espécie em algum momento da nossa seleção biológica por
quaisquer motivos que desconhecemos.
Conclusivamente, hoje se sabe que
somos feios ou bonitos porque somos muito diferentes e somos muito diferentes
porque temos que considerar que há milhões de anos atrás esses grupos foram
sendo selecionados biologicamente dentro de suas populações e, somente há
alguns poucos milhares de anos atrás, começaram a interagir entre si, do que se
depreende que esses novos cruzamentos entre pessoas muitíssimo diferentes deram
origem a novas características morfológicas ou predominância de umas em relação
às outras, ou até mesmo, mistura, e como os cruzamentos e as possibilidades são
infinitas, nesse caso, a diversidade de faces e tipos corpóreos também o são.
É mesmo tremendamente curioso
como não pensamos em coisas muito óbvias, como a razão de possuirmos impressões
digitais, por exemplo. A conclusão é que se elas não compusessem a estrutura da
nossa pele gordurosa, esta então seria lisa e, obviamente, não teríamos a
aderência necessária para segurar objetos mais complexos, isso não
inviabilizaria a nossa sobrevivência, mas de certo obrigaria a nossa pele a ser
mais grossa e, portanto, menos sensível ao tato, sentido fundamental. Por isso,
essa pode ter sido uma característica que evoluiu gradativamente com a
inteligência do homem, quando este passou a usar ferramentas. As digitais são
uma característica morfológica tão estupenda que são formadas no sexto mês de
vida uterina por movimentos peculiares a cada bebê e por isso, elas são únicas,
ninguém as têm iguais as de outro ser humano, nem mesmo gêmeos.
Por fim, adotando essa linha de
raciocínio, fica fácil perceber e entender o fenômeno da beleza e seu padrão.
Decorre do fato de que o hemisfério norte, por razões históricas, geográficas e antropológicas,
se desenvolveu muito mais do que o hemisfério sul, e por lá se verifica a clara
predominância de pessoas mais altas e claras, inclusive nos tons de cabelos e
olhos, o que originou um padrão nesse sentido, considerando ainda que por serem
mais ricos e em maior quantidade, esses grupos dominantes foram os últimos a
permitirem socialmente os cruzamentos de suas populações com as menos
favorecidas, do sul.
Repare que para nós ocidentais,
os chineses são horríveis. O mesmo deve acontecer para eles com relação a nós.
Isso se deve unicamente ao fato de que ainda não tivemos relações biomorfológicas
suficientes para criar um terceiro grupo, oriundo desses dois tipos humanos.
Há ainda outra coisa que não foi
abordada nesse texto por razões óbvias: as deficiências morfológicas ou
malformações. Trocando em miúdos, gente que é tida como feia porque têm
problemas físicos de nascença ou que teve doenças que originaram defeitos
físicos fora dos padrões genéticos (não estéticos) e biomorfológicos a que
estamos acostumados. Obviamente, essas pessoas têm problemas, síndromes,
doenças, e portanto, não podem e nem devem ser caracterizadas como feias, numa
abordagem mais simplista.
Então, a partir de agora, quando
vir alguém que ache bonito, por favor, não pense que essa pessoa foi favorecida
por qualquer fenômeno como a proporção divina, ou por seja lá o que acredite,
imagine antes que ela teve a sorte de ser vitimada por um acidente social que
culminou com o seu nascimento dotado de um biótipo com predominância de aspecto
adequado ao padrão, dentre os que se impuseram pela maioria.
E você aí, está se achando muito
bonito!?
Acorda: beleza ainda é somente um
ponto de vista!
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